ditadura

OUTRA GRAVÍSSIMA ACUSAÇÃO DO LULA: O AÉCIO NÃO LEVAVA MAÇÃ PRA PROFESSORA!

Os leitores podem até supor que eu esteja sempre procurando motivos para criticar o PT, mas os milhares de textos armazenados no meu blogue estão aí para provarem o contrário. São os petistas que, invariavelmente, dizem e fazem coisas com as quais não concordo, nem jamais concordei.

P. ex., transformar uma campanha presidencial numa competição para ver quem sataniza mais o adversário é o oposto de tudo que defendo. Trata-se da política degradada a arranca-rabo de cortiço.

A CPMF, que Dilma Rousseff tenta fazer-nos crer que era fundamental para a Saúde, nunca passou de um engana-trouxa a mais para tungarem os cidadãos. 

Nos tempos em que trabalhei nas editorias de economia, percebi claramente que, pior ainda do que Bancos Centrais dóceis ao grande capital, são os BC’s subservientes aos governos. Por que? Porque estes últimos querem mesmo é colocar a economia a serviço dos interesses e conveniências da politicalha. Fazem-no de forma tão grosseira que criam o pior dos mundos possíveis

E que dizer do teste do bafômetro, que Lula resolveu utilizar como arma contra Aécio Neves? Pelas ninharias que anda colocando em circulação, daqui a pouco ele vai acusar o tucano de nunca ter levado maçãs para sua professora do pré-primário…

Aécio se recusou a fazer o teste em 2011? Palmas para ele! Pois eu também JAMAIS me submeteria a tal constrangimento, típico de regimes totalitários. Por sorte, minha idade e aparência me colocam na leva dos que os policiais mandam passarem direto.  

Tendo detestado cada segundo que vivi sob ditadura, subo nas paredes quando tentam me impor o mesmo tratamento em plena democracia; não dou satisfações a quem não está legalmente autorizado a exigi-las, sempre preferi correr o risco de perder bons empregos do que permitir que censurassem meus textos, etc.

Quanto aos testes impostos aos motoristas, eis o que escrevi sobre eles, em março de 2012, no artigo STJ fulmina a Lei Seca. Bravíssimo!:
Finalmente, uma decisão memorável do STJ, ao esvaziar, na prática, a famigerada  Lei Seca.
Tão patética quanto a que fez a fortuna dos gangstêres de Chicago, a Lei Seca  do volante parte de um princípio inaceitável numa democracia: o de que o cidadão é culpado até que prove sua inocência.
Qualquer motorista era laçado a esmo (na contramão do princípio da igualdade de todos perante a lei) e constrangido à humilhação do bafômetro.
Se, exercendo suas prerrogativas constitucionais, não aceitasse produzir provas contra si mesmo, ainda assim poderia ser processado, condenado, preso, com base nos depoimentos imprecisos de: 
  • testemunhas (nas situações normais sempre há poucas: por comodismo ou por principio, a grande maioria prefere viver e deixar viver);
  • guardas de trânsito (otoridades  que, quando desobedecidas, ficam furibundas e tudo fazem para retaliar os autores do crime  de lesa majestade, donde o STJ agiu certíssimo ao cortar-lhes as asas); e
  • médicos (cujo  exame visual  nada mais é do que um palpite, além de tenderem a, quando a serviço da Polícia, vestirem a camisa de repressores com o ardor de um Harry Shibata).

Crianças são tuteladas.

Adultos são donos do seu nariz.
A Lei Seca original (1920-1933) foi um total fracasso 
Infelizmente, nas marchas e contra-marchas da nossa Justiça, o mostrengo por ora voltou a viger. Torço para que a Ação Direta de Inconstitucionalidade interposta cumpra o seu papel, garantindo os direitos individuais contra a imposição de arbitrariedades a pretexto de proteção da coletividade. 

Por este caminho, dá para se justificarem todas e quaisquer medidas autoritárias. Trata-se da mesmíssima racionália aplicada pelos EUA e países europeus após o atentado ao WTC: cidadãos com traços físicos e/ou sobrenomes assemelhados aos árabes eram revistados, detidos, interrogados, maltratados, confinados, em função do mero palpite de que pudessem ser terroristas.

De resto, até agora, não havia nada no Aécio que me entusiasmasse. Nem lembrava do episódio em questão, mas a atitude dele é daquelas que, partindo de quem partir, sempre aprovarei (só desaprovo o seu recuo tático no debate do SBT, mas nenhum candidato ousa ser politicamente incorreto no meio de uma eleição). Os brasileiros são caninamente submissos ao autoritarismo, precisamos de quem lhes dê exemplo de postura cidadã altaneira.

Obs. Não li nenhuma referência ao branco que deu em Dilma durante o debate da Band, mas é provável que alguém mais tenha percebido. O certo é que eu notei, registrei (vide aqui) e, em seguida, abordei exatamente o problema da exaustão física e mental dos candidatos, pois ficou evidente para mim que ela, ou havia travado, ou tonteado. Logo após o debate do SBT aconteceu de novo e a presidenta teve de ser amparada para não cair. 

A DIREITA JÁ ESTÁ COGITANDO IMPEACHMENT E GOLPE DE ESTADO?

Há internautas que querem encontrar, em todos e quaisquer posts por eles lidos, apenas a reiteração de suas opiniões e mais munição propagandística para fazerem a cabeça alheia. 
Então, cada vez que eu aponto aspectos diferentes de questões tratadas com simplismo e tendenciosidade nas redes sociais, hostilizam-me como a um herege. E, quando eu lanço um alerta a respeito de algo que quero evitar, eles, em seu assustador primarismo, acreditam que eu esteja torcendo para que tal coisa aconteça. É de desanimar.
Por que minhas análises costumam ser bem diferentes do ramerrão? Por vários motivos, mas vou citar os principais:
  • aos 18 anos, como combatente de uma das principais organizações de resistência à ditadura militar, fui incumbido de criar e chefiar o primeiro serviço de Inteligência da guerrilha brasileira. Até então, como qualquer leitor comum, eu buscava na imprensa apenas as informações, interpretações e opiniões que coincidiam com meus pontos-de-vista. Para bem cumprir a minha nova missão, tive de aprender a acompanhar todo o noticiário e, mesmo nos veículos reacionários por excelência, garimpar informações úteis. Ou seja, a ler criticamente tais veículos e filtrar aquilo que interessava à VPR;
  • depois, em 31 anos de exercício do jornalismo profissional, continuei aprimorando-me na arte de entender o inimigo para melhor o combater.
Então, acho hilário comentaristas tentarem me desqualificar porque tenho a Folha de S. Paulo como uma das minhas principais fontes de informação. Ora, o que, a partir dela, consigo captar dos bastidores políticos é de valor inestimável para mim.
E, longe de o jornal da ditabranda cooptar-me para suas posições, sou um dos cidadãos que melhor o questiona, que mais vezes dele arrancou retratações e que sistematicamente tem seus direitos como leitor e como personagem histórico escamoteados pela Redação e pelos sucessivos ombudsmans.

Da mesma forma, leio atentamente o Reinaldo Azevedo e um sem-número de vezes fiz artigos devastadores rebatendo seus textos, sem que ele jamais ousasse responder. 

P. ex., o RA acaba de qualificar a VAR-Palmares de terrorista, repetindo a falácia do Ternuma e dos sites que abrigam os remanescentes daqueles que foram os verdadeiros e únicos terroristas dos anos de chumbo no Brasil: os terroristas de estado. Quem pega em armas contra ditadores (e isto é reconhecido desde a Grécia antiga!), nada mais faz do que resistir à tirania. 
É como a ONU, o Direito dos povos civilizados e todos os cidadãos conscientes encaram a questão. O que RA e os reaças em geral repetem à exaustão não passou de uma jogada propagandística arquitetada pelos serviços de guerra psicológica das Forças Armadas no auge do pior totalitarismo que o Brasil já conheceu. Era só pra enganar trouxas; e há raposões que, repetindo tal infâmia, continuam enganando trouxas até hoje.
Infelizmente, o mestre da propaganda enganosa da direita às vezes está certo em sua refutações da propaganda enganosa petista. Considero vergonhoso que os do nosso lado apelem para a demagogia mais rasteira e mais facilmente refutável, como a afirmação, tantas vezes repetidas por Dilma Rousseff, de que FHC teria quebrado o Brasil três vezes.

Talvez por me irritar profundamente a maneira como a presidenta se ufana de haver botado as contas com o FMI em dia –sempre preferi a posição do Brizola, de confrontar o principal cão de guarda dos interesses capitalistas–, confesso que não havia, até agora, atentado para este aspecto. 

Mas, como me interessa conhecer sempre a verdade, jamais me alinhando com mentiras amigas, fiz uma busca virtual e acabei constatando que o Brasil quebrou (entrou em moratória) apenas uma vez, sob Sarney; e que pedidos de socorro financeiro ao FMI não equivalem a quebras. Este artigo esclarece bem a questão.
Sei que pouco ou nada adiantará eu haver apontado aqui mais esta forçação de barra panfletária, assim como devo ter sido o primeiro a desmascarar o jogo sujo de apresentarem uma herdeira como banqueira, embora ela jamais tivesse exercido tal atividade. E estou consciente de que poucos esquerdistas da atualidade dão à verdade e à transparência a importância que eu dou. [Aliás, também aos direitos humanos, para meu enorme pesar. Será que as novas gerações precisarão sofrer na carne as consequências da privação dos DH, como nós sofremos, para passarem a conferir-lhes o peso devido?!]
Se a única opção para eu permanecer na esquerda fosse coonestar falsidades, eu preferiria passar o resto dos meus dias numa ilha deserta. Meus paradigmas jamais foram Goebbels ou Maquiavel, mas sim Marx, Proudhon, Trotsky, Rosa Luxemburgo, Gramsci e que tais.

Para finalizar, eis um trecho de artigo do RA que não deveria ser ignorado como foi, nem tido tão-somente como mais do mesmo besteirol de sempre:

Prestem atenção! Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef mal começaram a falar. A depender do rumo que as coisas tomem e do resultado das urnas, o país voltará a flertar, no próximo quadriênio, com o impeachment, somando, então, a crise política a uma economia combalida.

A pergunta é: trata-se apenas de uma conjetura do RA ou, com seus óbvios acessos a fontes direitistas, ele está antecipando qual será a cartada seguinte, já decidida por nossos inimigos? 
Enfim, dependendo do resultado de 26 de outubro, teremos de estar muito atentos para a possibilidade de que logo seja apresentado um pedido de impeachment da Dilma; e de que em seguida, aproveitando a conjugação das crises econômica e política, os suspeitos habituais façam uma tentativa golpista. 
O que não podemos é ser novamente surpreendidos sem nenhum esquema preparado para reagirmos, como o fomos em 1964. Aliás, este é um calo que me dói muito, pois a minha geração depois se imolaria como consequência da leviandade dos que, subestimando a quartelada anunciada, permitiram que os militares os escorraçassem do poder com um piparote.

MEMORIAL DA RESISTÊNCIA PROMOVE FEIRA DE LIVROS SOBRE OS ANOS DE CHUMBO; ESTAREI LÁ.

Neste sábado (04/10), vou autografar meu Náufrago da Utopia na III Feira de Livros do Memorial da Resistência de São Paulo (Largo General Osório, 66 – bairro da Luz). Estarei aguardando os companheiros no estande da Geração Editorial, das 13 às 18 horas.


Como tenho notado que muitos leitores começaram a acompanhar meu trabalho nos últimos anos, sem terem a mínima noção de quem eu seja, vou me permitir retirar do baú aqui uma longa entrevista que concedi ao jornalista Ciro Campelo em 2006. 

Servirá para apresentar-me às novas gerações e reavivar a memória das velhas. 

E dá uma boa ideia da trajetória reconstituída no meu livro, que se trata, basicamente, de uma autobiografia narrada em estilo de ficção, pois quis torná-la mais dinâmica e atrativa para os leitores não focados especialmente na política.
A VERDADEIRA HISTÓRIA 
DE CELSO LUNGARETTI

Por Ciro Campelo

Injustiçado por mais de 34 anos o ex-guerrilheiro Celso Lungaretti, conseguiu provar a sua inocência no final de 2005, com o lançamento do livro Náufrago da Utopia.
A história de Celso se confunde com a história de muitos guerrilheiros injustiçados pela esquerda armada dos anos 60/70. Podemos citar entre eles Paulo de Tarso Venceslau, Wellington Moreira Diniz e Cláudio Torres. O certo é que poucos militantes foram tão injustiçados como ele, que hoje nos concede essa entrevista a fim de esclarecer alguns fatos ainda obscuros por tantos anos e que vieram a tona com o lançamento desse livro.
Celso Lungaretti é paulistano, nascido em 06/10/1950, filho único de Reynaldo Lungaretti (contra-mestre de fiação e tecelagem) e Mafalda Vannucci Lungaretti (dona-de-casa). O seu livro foi lançado pela Geração Editorial, do Luiz Fernando Emediato, em 10/11/2005.
Em mais de 14 páginas de entrevista concedida a mim, ele fala sobre a sua militância no movimento estudantil no ano de 1968, como começou a se interessar pela guerrilha, como foi seu recrutamento na VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), fala sobre as falsas acusações feitas por ex-companheiros de militância, e fala sobre sua reabilitação. A entrevista é longa, porém, extremamente esclarecedora. 
Ciro Campelo – Celso, você era bem novo quando começou a militar no movimento estudantil. Com que idade você começou a militar, e o que te levou a ter essa consciência de militar no ME?

Celso Lungaretti: Eu tinha 16 anos e cursava o 2º ano do Científico de Engenharia numa escola da Mooca. Eu era tímido, e não ficava muito à vontade com as garotas do bairro, quase todas fãs da Jovem Guarda e dos Beatles, que eu detestava. O lugar dos meninos conhecerem as meninas eram os bailinhos, e eu era meio travado para dançar. Então, como qualquer adolescente, tinha muita vontade de chegar nas garotas, mas a falta de jeito me tolhia.

Ao mesmo tempo, lia livros de autores sérios como Dostoievski, Kafka, Camus, Sartre e Carlos Heitor Cony. Já começava a ver filmes de arte, como os do Godard e do Glauber Rocha. O Eremias Delizoicov, colega de escola desde criança, apresentou-me um dia à Maria das Graças, que estava na classe dele (começamos juntos, mas ele repetiu dois anos e foi ficando para trás, então estava na 4ª série ginasial). Ela era filha de um militante do PCB que teve de fugir da Bahia para São Paulo; estava querendo formar uma base no nosso colégio, o MMDC.
A partir dessa amizade, minha vida foi mudando. Nas férias do meio de ano, troquei o Científico pelo Clássico. Caí na classe em que era feito o jornal do colégio e, por desinteresse dos responsáveis, acabei logo o assumindo e virando o faz-tudo. Usei o jornal para começar um trabalho político entre os colegas. Aí, nas férias de fim de ano, a Maria propôs formalmente a criação de uma base comigo, o Eremias e dois irmãos do bairro do Belém. Fizemos um curso básico de marxismo e, no começo do ano letivo de 1968, já estávamos organizando o movimento secundarista em toda a zona Leste de São Paulo. 
CC – O ano de 1968 foi decisivo para todos os que entraram na luta, principalmente em dezembro, com a decretação do AI-5. Esse ano mudou a vida de muita gente. Eu sei que você ainda era novo. Mais como você viu o ano de 1968?

CL: Foi um ano que valeu por dez na vida das pessoas que mergulharam fundo nos acontecimentos. Tudo se passava com tal velocidade que não conseguíamos nem captar direito as consequências de cada uma de nossas atitudes. Só quando parei para refletir, na prisão, é que consegui avaliar bem as coisas. Mas, a sensação que ficou é de que éramos empurrados pela História, muito mais reagindo do que agindo.

A Frente Estudantil Secundarista, criada por nós, rachou. A Maria das Graças ficou com o pessoal da Zona Centro, e eu herdei todo o resto do pessoal e da estrutura da Zona Leste, tornando-me o líder do nosso grupo, que permaneceu independente.
Passamos o ano entre passeatas, assembleias, levando corridas dos policiais, agitando. Paramos o MMDC numa noite de sexta-feira, no final de junho, com o Deops chegando a invadir a escola; o saldo foi a transferência compulsória dos quatro líderes, a Maria das Graças, o Eremias, o Diego e eu.
A repressão ficou cada vez mais intensa ao longo do ano, assim como a violência dos grupos paramilitares que agiam impunemente.

O CCC matou um secundarista durante conflitos entre os estudantes direitistas do Mackenzie e os esquerdistas reunidos na Faculdade de Filosofia da rua Maria Antônia.

O Congresso da UNE em Ibiúna foi estourado pela repressão, com os participantes sendo todos presos.

A chamada ‘batalha da rua Maria Antônia”, em 1968.

No final do ano, percebíamos que o tempo do movimento de massas estava chegando ao fim. Antes mesmo do AI-5 ser promulgado, em dezembro, já chegáramos à conclusão de que a única forma de continuarmos lutando era engajando-nos a uma organização armada. O Marcos Vinícius nos colocou em contato com a ALN, o POC, o PCBR e a VPR. Fizemos reuniões separadas com os recrutadores de cada uma delas.

Comecei 1968 como um menino que nunca havia feito nada de realmente importante. Acabei o ano como adulto, responsável pelo destino de meus sete melhores amigos e companheiros, pronto para passar a um estágio superior da luta: o vencer ou morrer dos guerrilheiros. 
CC – Porque vocês escolheram a VPR?
CL: Éramos oito jovens dispostos a ingressar como militantes plenos numa organização armada, além de contarmos com alguns aliados e simpatizantes que, a critério dessa organização, poderiam ou não ser aproveitados.
Das aproximadamente cem pessoas que organizamos em nossos grupos de discussão e atuação no movimento secundarista, menos de 10 tinham esse perfil de aliados e simpatizantes. E só nós oito estávamos dispostos a dedicarmo-nos integralmente à revolução: assumir os riscos da militância e, se necessário, abandonar a vida legal.

Os restantes deixamos organizados sob a liderança dos nossos pupilos mais promissores. Distanciamo-nos deles todos, pois representavam um grave risco de segurança para nós.

Nós oito fizemos reuniões com militantes de quatro organizações.
O POC (Partido Operário Comunista) nos pareceu apenas uma organização de universitários, sem potencial para cumprir as tarefas armadas da revolução.
Avaliamos o PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário) e a ALN (Ação Libertadora Nacional), porém optamos pela VPR.
A VPR oferecia tudo que procurávamos. Era o resultado da junção de duas forças. Ex-militares brizolistas que, com certeza, saberiam nos instruir e comandar. E antigos quadros da Polop (Política Operária), responsáveis por um programa que, no papel, soava muito bem. O Antonio Roberto Espinoza e o José Ibrahim, ao manterem contato conosco, esqueceram de dizer que esses dois componentes viviam em brigas constantes: “militaristas” e “massistas” disputavam a supremacia dentro da VPR.
De quebra, a VPR contava com os líderes da greve de Osasco, o que também era motivo de admiração para nós. Decidimos entrar. Mas, o pessoal do movimento secundarista da Zona Sul, sem que soubéssemos, já nos antecedera. Em fevereiro de 1969, alguns deles participaram de um assalto a banco ou casa de armas. Nas quedas da VPR, o Marcos Vinícios foi arrastado. E, como ele conhecia a identidade real do Eremias, Diego, Edmauro e a minha, tivemos de cair os quatro, precipitadamente, na clandestinidade.
Passamos duas semanas de grandes privações, até a chegada do ponto seguinte com o Espinoza, que nos socorreu.

“…quando a VPR aceitou receber-nos como 
militantes plenos, bateu aquela euforia de time do Amapá 
que finalmente consegue jogar no Maracanã…”
Passeata no centro de São Paulo

CC – E como foi para você cair tão novo na clandestinidade?

CL: Os sentimentos eram mais ou menos os mesmos para todos nós. Havíamos passado um ano sendo tratados como inferiores pelos universitários, que evitavam nos esnobar ostensivamente, mas não conseguiam esconder de todo sua presunção.
Então, quando a VPR aceitou receber-nos como militantes plenos, bateu aquela euforia de time do Amapá que finalmente consegue jogar no Maracanã. Um deslumbramento. Seis meses antes, distribuindo panfletos em escola. Agora, travando conhecimento com alguns dos principais revolucionários brasileiros. Que jovem não subiria às nuvens?
Misturado à euforia, o temor de não estarmos à altura das experiências que iríamos viver. Se um de nós falhasse numa passeata, podia fazer com que o companheiro caísse e levasse alguns cascudos da repressão. Agora, entretanto, se um de nós falhasse numa ação armada, o companheiro morreria ou sofreria torturas terríveis. Tínhamos essa noção de que, de repente, a responsabilidade nas nossas costas se tornara imensa.
E, por mais que tivéssemos aquela postura adolescente de achar que as coisas ruins não aconteceriam conosco, no fundo, no fundo, sabíamos que cada dia poderia ser o último. Talvez nem tanto num primeiro momento. Mas, a partir das quedas e mortes de companheiros que conhecíamos, era inevitável o pensamento: até quando durarei?

Ao longo de 1969, a luta foi se tornando tão desfavorável para os revolucionários que os militantes dificilmente ultrapassavam uns seis meses de clandestinidade. Então, eu me lembro de ter fixado a meta de sobreviver pelo menos um ano, o que naquelas condições, já equivalia a ser um veterano.

Cuidado com o que você deseja, pode se tornar realidade. Foi exatamente depois de militar um ano na VPR que o DOI-Codi me prendeu. Quando eu já me via como um veterano.
CC – Você ficou “queimado” muito rápido. Com muito pouco tempo de militância você já estava com o rosto estampado em cartazes de terroristas procurados. Como você ficou queimado tão rápido, e como foi pra você ser um procurado da justiça?
CL: Foi, evidentemente, um companheiro que me conhecia, caiu e abriu minha identidade. Mas, deixa pra lá.
Só fiquei sabendo que a repressão já me conhecia quando foram lançados os cartazes de procurados. Num deles eu aparecia.
Eu e o Moisés estávamos morando num apartamento da Barra Funda. Fomos os primeiros a locá-lo, cheirava a tinta. Nosso acerto com o locador era verbal, não havia nem contrato em nosso nome. A situação ideal para qualquer clandestino. Lamentamos muito perder um local tão bom.

Logo cedinho, vimos nos jornais do dia a imensa matéria sobre os cartazes. Corremos a fazer as malas, deixando um monte de utensílios e livros para trás. Depois o Moisés mandou uma carta para o português, com algum dinheiro e autorizando-o a vender nossos pertences. Explicou que éramos revolucionários perseguidos pela ditadura.

Mais tarde fiquei sabendo que a repressão esteve na casa dos meus pais, de madrugada. Depois de virarem tudo de cabeça pra baixo sem encontrar pista nenhuma, disseram pro meu pai recomendar-me que me entregasse, caso contrário acabaria morrendo. Com eles, eu estaria seguro. Meu pai respondeu, na lata: “E foi pra garantir a segurança dele que vocês vieram aqui com toda essa artilharia?”. Ameaçaram levar o velho preso, mas acabaram deixando barato.
Estar sendo procurado me criou muitos problemas. Desde mudar a aparência, para ficar bem diferente da foto que eles haviam apanhado no Colégio MMDC, até ter eventualmente de ficar abrigado com outros companheiros, o que implicava ser transportado de cabeça baixa para entrar e sair do aparelho sem reconhecer o local, dependendo sempre dos horários de quem me abrigava, etc…
Cheguei a jantar num restaurante bem ao lado do cartaz com a minha foto. Ninguém deu a mínima. O cidadão comum nunca imagina que uma pessoa respeitável possa estar sendo procurada pela polícia.
Então, nós, os chamados imortais da Oban, caprichávamos em manter a aparência mais inofensiva possível. Verdadeiros anjos, com um 38 na pasta capanga.
Lamarca, ainda no Exército: aulas de tiro para bancárias. 

CC – Faça um breve histórico de sua militância na VPR.

CL: Nosso grupo de oito revolucionários, já havia se decidido pelo ingresso na VPR, porém essa escolha foi feita às vésperas do congresso da Organização.
Então, a VPR considerou que não poderia receber-nos nessa fase intermediária e propôs que indicássemos um representante para participar desse congresso, que foi realizado em abril de 1969 numa casa de praia de Mongaguá, litoral sul paulista. Fui o escolhido pelo grupo.
Curiosamente, faria mais sentido eu ir como observador, mas a VPR não pensou nisso. Participei como delegado, tendo tanto direito de voto quanto os outros (se bem me lembro, uns 10 ou 12).

Saímos de lá com a linha política definida (aliás, as propostas que meu grupo formulou para a discussão acabaram prevalecendo no capítulo de cenário internacional, cuja redação final foi minha) e um novo comando nacional eleito. No final dos trabalhos, meu grupo foi formalmente aceito na organização.

“…todos nós estávamos escalados para participar
de um duplo assalto de bancos na rua Piratininga, pois a O.
precisava urgentemente de fundos…”
De volta, todos nós estávamos escalados para participar de um duplo assalto de bancos na rua Piratininga (entre o Brás e a Mooca), pois a O. precisava urgentemente de fundos.
Na véspera, quando deveria me integrar ao grupo de ação e discutir detalhes, o Antonio Roberto Espinoza me deu uma contra-ordem: eu havia sido designado para integrar o Comando Estadual da VPR em São Paulo, como responsável pelo setor de Inteligência, que me caberia criar. E, portanto, não deveria participar do assalto.
João Domingues: morto na tortura.

Os acasos da vida: durante essa ação, o Lamarca foi obrigado a matar um guarda de trânsito que irrefletidamente se colocou na porta de um dos bancos, com a arma engatilhada, esperando algum companheiro sair. Se eu estivesse lá, pegaria depois pena de prisão muito maior. Mas, naquele momento, ninguém pensava nisso. Acreditávamos que venceríamos. Quem julgaria o inimigo derrotado seríamos nós…

Fui erguendo um setor de Inteligência com aliados e informantes. Fazia, principalmente, análises sobre os bastidores do poder, a luta interna entre a linha dura militar e os partidários de uma gradual redemocratização. Era importante para nós sabermos para que lado iria o regime e qual a posição que prevaleceria em cada momento.
Vez por outra, tínhamos que lidar com alguma informação de interesse operacional mais direto. E começamos também a providenciar documentos falsos.
Mas, travava-se de uma Inteligência bem embrionária. Minha contribuição maior era como integrante do comando estadual, ao lado do Samuel Iavelberg (movimento de massas), João Domingues da Silva (grupos armados) e José Raimundo da Costa, o Moisés (contato com outras organizações e com grupos revolucionários do interior paulista).
Em meados de 1969, os comandos da VPR e do Colina decidiram fundir as organizações, formando a VAR-Palmares. Esta decisão, no entanto, deveria ser homologada pela militância, num congresso futuro.
De imediato, a nova Organização foi resolver o problema sempre premente: finanças. Com grande proporção de militantes clandestinos, que não podiam obter por si próprios recursos para seu sustento, precisava de muito dinheiro.
O roubo do cofre do Adhemar, executado com excelente planejamento e extrema perícia, nos livrou de preocupações por um bom tempo. Livres do sufoco, poderíamos nos dedicar aos verdadeiros objetivos.
“Moisés”: preso e depois executado.

O João Domingues foi ferido, preso e morto pela repressão, que o torturou antes de estar restabelecido dos ferimentos e provocou uma hemorragia. Com isto, a VPR de SP virou um pandemônio, pois ele centralizava muitas informações. Aparelhos e depósitos de armas cuja localização só ele conhecia, evaporaram. Outros aparelhos se tornaram perigosos e tiveram de ser abandonados. Militantes se amontoavam nos restantes.

Em meio a esse caos, eu, o Moisés e o Samuel decidimos que não havia como organizar uma conferência em SP para indicar os representantes ao congresso nacional da VAR.
A luta entre “militaristas” e “massistas” recrudescera. A fusão com o Colina deu novo alento aos massistas da VPR, que haviam ficado em minoria. Recebendo reforços, voltaram a ter influência marcante na tomada de decisões, principalmente porque detinham uma posição chave.
Quatro comandantes nacionais cuidavam da luta principal, tratando de organizar a guerrilha no campo. E dois faziam a ligação com as cidades. Ora, esses dois (o Antonio Roberto Espinoza e o Carlos Franklin da Paixão Araújo) estavam mais próximos da posição massista, emperrando os encaminhamentos no campo e favorecendo o crescimento da organização nas cidades.
O Moisés e eu decidimos lutar para que a fusão fosse desfeita e a VPR voltasse à sua identidade original. Quando um militante sem muito prestígio na Organização, que acabava de voltar do exterior, lançou teses inovadoras sobre a luta armada, vimos que se tratava do complemento ideal para nossa proposta de recriação da VPR.
Com o pacote teórico do Jamil (Ladislau Dowbor) e a proposta de desfazer a fusão, fomos à luta. Indicamo-nos representantes de SP ao congresso porque avaliamos ser impossível realizar conferência estadual quando nossa segurança estava tão precária. No entanto, o Samuel reagiu. Ele concordou que cabia ao comando paulista avocar essa decisão, escolhendo os dois delegados. Mas queria que fosse um de cada posição: eu, ou o Moisés, do lado militarista; e ele, como massista.
“Jamil” hoje é professor de economia na PUC/SP.

Ao ser preterido, queixou-se ao Espinoza e ao Paixão Araújo, que denunciaram aos quatro outros comandantes o que disseram ser um golpe. Resultado: nossa delegação foi cassada e nossos inimigos organizaram às pressas uma precária conferência paulista, em que eu e o Moisés saímos vencidos. O Samuel, que havia vacilado entre um lado e outro, também acabou na berlinda, muito criticado.

No entanto, por conhecermos o local do congresso nacional (Teresópolis, RJ), eu e o Moisés fomos obrigados a voltar e servir de seguranças até o final dos trabalhos. Sem que eu soubesse (ele era cheio de segredos), o Moisés acertou com o Bacuri que, caso nossa permanência na VPR se tornasse insustentável, nós dois iríamos para a Rede (Resistência Democrática)…
As posições militaristas foram derrotadas em toda a linha, sem que o Lamarca se preocupasse muito em defendê-las. Acreditava que, detendo as rédeas do comando, ele encaminharia a organização na direção certa, pouco importando as definições que estivessem no papel.
O último item foi a definição do novo comando. Quando o Lamarca percebeu que não teria o poder real, ficando como uma espécie de figura de proa, decidiu virar a mesa. Comandou um racha que seguiu, exatamente, a linha que o Moisés e eu propúnhamos: voltarmos a ser VPR, assumindo as posições teóricas do Jamil.
Fomos sete os que rachamos em Teresópolis, em outubro/1969: Lamarca, Darcy Rodrigues, o marinheiro Cláudio de Souza Ribeiro (“Matos”), o Nóbrega, o Mário Japa, o Moisés e eu. O casal Juarez e Maria do Carmo Brito ficou de pensar melhor e decidir depois. A VAR manteve dois terços dos quadros da Organização.

“não suportando estar no isolamento do campo 
enquanto meus companheiros morriam na cidade, pedi 
uma designação urbana…”
Massafumi: estigmatizado, ensandecido, cometeu suicídio.

Aí, estressado pela luta política e cansado de tantas discussões e tão pouca ação, decidi não comparecer ao pequeno congresso em que se definiram as bases da VPR rediviva. Logo estava no campo, integrando a equipe precursora para a montagem de uma escola de guerrilha na região de Registro, ao lado de Lamarca, Fujimori, Massafumi e o velho Lavecchia.

Passei quase dois meses lá. A área tinha vários inconvenientes e foi abandonada. O Massafumi aproveitou para pedir o desligamento da VPR. E eu, não suportando estar no isolamento do campo enquanto meus companheiros morriam na cidade (o Eremias Delizoicov, amigo meu desde a infância e por quem me sentia responsável, acabava de ser assassinado com 35 tiros), pedi uma designação urbana.
Assim, eu e o Massafumi voltamos para SP, enquanto os outros três seguiram para a nova área de treinamento guerrilheiro. Pelos papos, dava a impressão de que se localizaria a grande distância, provavelmente no Paraná.
Incumbido de criar um setor de Inteligência no RJ, lá atuei de janeiro a abril de 1970, quando fui preso pelo DOI-Codi.
CC – Celso, como a área de registro que você conhecia foi desativada, como o Lamarca acusou você de ter delatado a área de nº 2?
Até napalm foi utilizado no cerco do Vale do Ribeira

CL: Ciro, vou relatar os fatos a partir de uma visão retrospectiva, incorporando aquilo de que só tomei conhecimento depois.

Quando eu e o Massafumi nos despedimos do Lamarca, na área de treinamento guerrilheiro que fora vetada por inadequação aos nossos propósitos, ele nos disse que, embora aquele sítio não tivesse mais utilidade para a VPR, não deveria ser aberto para a repressão.
E fui preso pelo DOI-Codi no dia 16 de abril de 1970, uma 5ª feira, às 6h45.
Sabendo que os aparelhos que o militante preso conhecia estavam sendo abandonados pelos companheiros, os pontos desmarcados, etc., a repressão desenvolveu um método de torturas violentíssimas nas primeiras horas. Para os dois lados, era uma corrida contra o tempo. No final da tarde, muito abalado pelas torturas e mobilizando minhas últimas forças para não dar à repressão o fio da meada (companheiros que, presos, poderiam delatar outros companheiros, levando às quedas em cascata que tanto temíamos), abri a área abandonada.
Entregar o que não tinha mais utilidade ou o que a repressão já sabia era a forma de fingirmos estar colaborando, enquanto preservávamos o que realmente importava. Mas, claro, esse era sempre um jogo arriscado.
A repressão do RJ não deu muita importância a essa informação, tanto que a repassou à Oban de SP só no dia seguinte. Então, na 6ª feira a Oban enviou duas patrulhas a Registro, para fazerem averiguações no local. Ambas voltaram no sábado (18) com a informação de que a área estava mesmo desativada.

Até então, o Lamarca não ordenara a evacuação da área ativa, que, na verdade, distava apenas 16 quilômetros da área abandonada. Mas o fez a partir do momento em que tomou conhecimento das novas prisões efetuadas pela repressão naquele sábado (ele tinha um ou mais espiões no próprio aparelho repressivo, provavelmente ex-colegas de farda, informando-o de tudo que acontecia).

Lungaretti, após 2 meses preso…

Naquele sábado, segundo consta de um relatório de operações secreto do II Exército, a repressão tomou conhecimento da localização da área ativa, a partir de “outras informações” decorrentes das novas prisões.

O cerco da área 2 começou a ser montado. Aliados da VPR que moravam na região foram presos na semana seguinte.

No início de junho de 1970, o Lamarca me atribuía a culpa pela queda da área de treinamento (sem nunca fazer referência à existência das duas áreas, uma ativa e a outra abandonada) e a VPR me deixava de fora da lista de presos trocados pelo embaixador alemão.

CC – Então você foi usado como um simples bode expiatório, talvez para não revelar que um companheiro mais importante tenha revelado a área, é isso mesmo?
CL: Quem reconstituir a seqüência de quedas da VPR em abril, quando a Organização foi quase aniquilada tanto no Rio de Janeiro quanto em São Paulo, verificará que nada de significativo pode me ser atribuído (tanto que a VPR nunca me acusou disso).
O Lamarca não havia considerado que minha prisão colocava a área ativa em risco, mas a abandonou quando outros militantes caíram, o que comprova que ele sabia muito bem onde morava o perigo. Então, a decisão de me erigir em bode expiatório pela queda da área ativa, inclusive me deixando em poder da repressão quando deveria ser incluído na lista de troca se obedecidos os critérios vigentes na VPR, não tem uma explicação fácil.
O Ivan Seixas lembrou o ambiente de grande tensão em que eram tomadas as decisões, em meio a quedas, mortes e informações desencontradas. Mas, só o Lamarca poderia dar a última palavra num assunto tão importante, contrariando um compromisso que a VPR assumira comigo (enquanto eu sofria o diabo para cumprir da melhor maneira possível os compromissos que assumira com a VPR); e ele (Lamarca), mais do que ninguém, sabia a verdade.
…e após 8, ao depor na Auditoria da Marinha…

Haveria vários inconvenientes para a imagem da VPR e da guerrilha se fosse amplamente conhecido o nome da pessoa que realmente abriu a área ativa, e eu, jovem secundarista de uma família sem passado revolucionário nem prestígio social, era sacrificável; foi o que aconteceu.

Homem que nunca deixou de ter mentalidade militar, talvez o Lamarca tenha decidido me punir por haver desrespeitado sua voz de comando. Ao me alertar de que não deveria abrir a área 1, ele levou em conta que a área 2 fora conseguida com os préstimos da mesma pessoa, um ex-prefeito de Jacupiranga. Realmente, ao abrir a área 1 eu coloquei, sem saber, a área 2 em risco. Mas, para minha sorte, os militares não chegaram a ela por esse caminho.

“…houve uma espécie de pacto para que sempre fosse 
apresentada a versão ‘conveniente’ a historiadores e jornalistas. 
Até que a verdade acabou falando mais alto…”

O Lamarca, ao implantar dessa forma a área 2, umbilicalmente ligada à área abandonada pela figura do ex-prefeito Manelão, passara por cima das mais sagradas regras de segurança da VPR. Em liberdade na Argélia, eu poderia apontar à VPR os erros cometidos pelo Lamarca. Talvez ele tenha decidido que era mais conveniente me deixar onde eu não pudesse apresentar minha versão dos acontecimentos.

A VPR ainda cometeu duas outras terríveis injustiças, ao acusar também o Massafumi de responsabilidade na queda da área, quando ele nada teve a ver com essa história e ao não incluir na lista de troca do embaixador alemão o heroico Wellington Moreira Diniz, que havia resistido aos torturadores não as 24 horas que a Organização exigia, mas pelo menos 72 horas, antes de entregar um insignificante aliado (ligado, entretanto, ao principal fornecedor de simpatizantes para preencher nossas necessidades infra-estruturais).

…no mesmo dia e processo da foto célebre da Dilma.

A minha impressão é que a decisão de me tornar bode expiatório foi tomada pelo Lamarca. Depois, quanto mais o tempo passava, mais os envolvidos com as quedas em cascata de abril de 1970 foram percebendo a conveniência de que eu passasse à História como o grande vilão daquele período, de forma que não ocorresse a ninguém perguntar como, afinal, foram presos e mortos tantos quadros importantes em tão pouco tempo. 

Com a minha reabilitação, muitas outras biografias poderiam sair manchadas. Então, houve uma espécie de pacto para que sempre fosse apresentada a versão conveniente a historiadores e jornalistas. Até que a verdade acabou falando mais alto.
CC – Celso, e como você conseguiu que a “verdade falasse mais alto”, e você pôde provar realmente a sua inocência?
CL: Em seu livro Combate nas Trevas, lançado em 1979, o Jacob Gorender estranhou que a VPR tivesse me mantido no trabalho de inteligência no Rio de Janeiro, embora “soubesse” a localização da área de treinamento, quando o certo teria sido me mandar para o exterior. Realmente, as regras de segurança rezavam que o local da área não podia ser conhecido por nenhum militante urbano, mas apenas pelos que estivessem associados à sua implantação, como o Mário Japa (preso por uma infelicidade, ao vir cumprir qualquer tarefa em SP).

Com sua experiência de ex-combatente, o Gorender já em 1979 chegou perto da verdade.

Eu e o Massafumi, teoricamente, não representávamos perigo para a área 2, já que tínhamos estado somente na área 1. Mas o Lamarca, claro, sabia que as coisas não eram tão simples assim. Em vez de encontrar uma verdadeira solução para o problema, preferiu o caminho fácil de ordenar a mim e ao Massafumi que não abríssemos a área 1 e deixou de informar à Organização que sabíamos o suficiente para constituirmos uma ameaça à área 2. Ou seja, ele considerava que sua autoridade de comandante lhe permitia desconsiderar as regras de segurança, e, pior ainda, não comunicar aos demais companheiros que o fizera.
Em 1994, o Marcelo Paiva me acusou, nas páginas da Folha de S. Paulo, de delator da área de treinamento do Lamarca. Exigi espaço para resposta e, pela primeira vez, pude apresentar o meu lado da história. Foi a primeira referência à existência das duas áreas, até então ignorada pelo público, pela imprensa e pelo resto da esquerda.

O Marcelo recuou da acusação de que eu entregara a área ativa e contra-atacou com uma versão alternativa: a de que, abrindo a área 1, eu provocara a prisão de aliados que conheciam a localização da área 2. Com isto, eu passaria de delator pleno a delator involuntário. Mas, a cronologia dos acontecimentos, conforme eu descobri e provei em novembro de 2004, foi bem diferente.

Marcelo Paiva e Lungaretti travaram longa polêmica em 1994

Colocando meu nome num site de busca para acompanhar a repercussão da minha luta por anistia, encontrei, em outubro de 2004, o relatório de operações do II Exército que comprovava minha inocência em relação às acusações que me faziam e a veracidade de tudo que eu dissera a esse respeito na minha polêmica com o Marcelo Paiva.

Contatei vários jornalistas e historiadores que tinham afinidade com o tema, mas só o Jacob Gorender se dispôs a examinar minhas provas, confrontando-as com outros documentos secretos da repressão que ele disse possuir. Duas semanas depois, ele me telefonou para informar sua conclusão: eu estava certo, não tinha mesmo responsabilidade nenhuma pela queda da área 2, mas, apenas, pela descoberta da área 1, que, objetivamente, não teve maiores conseqüências.
A publicação da carta do Gorender na Folha de S. Paulo foi decisiva para que eu passasse a ser visto de outra maneira pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça e para eu receber cada vez mais apoio de ONGs, parlamentares, estudantes e pessoas não-dogmáticas de esquerda.
Quem conhece meus textos e pronunciamentos a esse respeito, sabe que jamais revelei publicamente o nome da pessoa que entregou a área e dos companheiros que foram coniventes com essa mentira. Questão de princípios.
Mas, como revolucionários, eles é que deveriam ter tomado a iniciativa de fazer autocríticas, inclusive das entrevistas tendenciosas que deram e de algum livro mentiroso que algum deles haja escrito. Mesmo porque os historiadores chegarão à verdade, da mesma forma como eu cheguei.
Presos políticos trocados pelo embaixador alemão

Na verdade, seu comportamento diante dos torturadores foi compreensível e justificável. O ser humano jamais deveria ser levado ao sofrimento extremo e é terrivelmente injusto recriminar alguém por não haver conseguido portar-se como super-homem.

Pior, muito pior, foi o que fizeram depois: livres, calmamente decidiram deixar que outro militante carregasse suas culpas por 34 anos. Isto sim foi uma falha de caráter inadmissível em revolucionários.
“…uma organização não é 
desbaratada daquela forma se vários 
militantes não fraquejarem…”


CC – Celso, então você sabe realmente quem foi que entregou a área dois?

CL: É claro que sei! Desde 1970 eu considerava possível que tal pessoa fosse responsável. No entanto, quando eu tomei conhecimento daquele relatório secreto militar, todas as peças do quebra-cabeça se juntaram na minha mente. E, afora ser uma questão de princípios não acusar alguém para inocentar-me, avaliei que a melhor resposta a dar àquela pessoa que me deixou sofrer injustamente por 34 anos era mesmo não denunciá-la publicamente.
Se ela tivesse dignidade, procuraria a imprensa para admitir sua culpa. Não o fazendo, acrescentou mais uma mancha em sua biografia. Jamais serei eu a dizer seu nome, mas, com as luzes que eu trouxe para a compreensão desse episódio, os historiadores podem facilmente chegar à conclusão correta.

CC – Você saberia dizer também quem foi o militante responsável pelas ‘quedas em cascata’?

CL: Quanto às quedas em cascata, não tiveram, obviamente, um único responsável. Uma organização não é desbaratada daquela forma se vários militantes não fraquejarem. A minha tese é a de que, por eu haver ficado malvisto externamente, alguns companheiros que tinham pesos na consciência perceberam que a existência de um vilão maior tiraria da alça de mira os vilões menores. Então, passaram a favorecer essa versão, de duas formas: referindo-se sempre a mim como culpado pela queda da área e jamais reconhecendo o papel importante que eu tivera até então na Organização.
Nas entrevistas que deram ao Jacob Gorender, chegaram ao cúmulo de me tirar da lista dos sete militantes que recriaram a VPR no congresso de Teresópolis, colocando outro companheiro no meu lugar!
Essas mesmas pessoas também deram referências as mais negativas sobre mim à Judith Patarra, quando ela escreveu o livro Iara. Também lá, eu caio de pára-quedas para desempenhar um mau papel, sem que nada fosse citado da minha militância anterior. E não é qualquer um que inicia um racha numa organização da importância da VPR aos 18 anos!
Logo que saiu o Combate nas Trevas, eu escrevi e telefonei ao Gorender para contestar a lista dos sete que ele publicara. Nunca deixei de me orgulhar da trajetória que tivera como militante até aquele fatídico abril de 1970. Então, ficava indignado com essa prática stalinista de reescrever o passado para roubar a glória de quem já não estava nas boas graças dos dirigentes supremos.

CC – Celso estamos em 2006, e você começou a militar em 1968. Passaram-se 38 anos. Você poderia nos falar, nesses 38 anos qual foi o pior momento que você viveu?

CL: Meu pior momento, obviamente, foi ter participado daquela farsa de arrependimento. Eu tinha todas as desculpas: fiquei incomunicável por mais de dois meses e sob torturas; encontrava-me tão debilitado que, do meu peso anterior de 85 quilos, perdera uns 25 desde a prisão; estava arrasado por causa das mortes do Eremias Delizoicov e do Roberto Macarini; a VPR cometera uma terrível injustiça comigo, não me colocando na lista de troca do embaixador alemão, o que teve o efeito colateral de encarniçar a repressão contra mim, fazendo-me passar por uma fase de torturas de intensidade idêntica à inicial e provocando a ruptura do meu tímpano; e, como resultado de tudo isso, minha capacidade de resistência chegou ao fim.
Como um zumbi, fui até a televisão e falei o que queriam que falasse. Cheguei até a pensar que nada daquilo acontecera, fora só um pesadelo. E levei alguns meses para voltar a me sentir totalmente normal, em termos de sanidade mental. Mas, quando recompus as forças, amaldiçoei-me por ter deixado que me reduzissem à prostração.
CC – Você pode nos contar com detalhes como foi que eles te fizeram ir até a televisão e posar de “terrorista arrependido”?

CL: Quando o embaixador alemão foi sequestrado, até a repressão acreditou que eu entraria na lista de troca. Apressadamente, eles colheram meu depoimento para o encerramento do inquérito (tratava-se do procedimento adotado no caso dos que viajavam). Haver ficado no Brasil foi péssimo.

Depois que o sequestro terminou eu passei a ser espancado até quando não tinham nada para perguntar. Mas, aproveitei bem uma chance que surgiu.
O coronel que presidia um inquérito de outra organização veio ao DOI-Codi me perguntar qualquer insignificância. E um major torturador, passando pelo local, não se conteve e me deu um soco na nuca, que me atirou longe. O coronel ficou indignado com o que considerou um desrespeito à sua patente superior. Ambos trocaram ofensas. Quando o coronel voltou, eu lhe disse que, se continuasse no DOI-Codi, acabaria morrendo.
Funcionou. O homem deveria ser influente, pois, na manhã seguinte, fui transferido para a PE da Vila Militar, cuja equipe deveria apenas encerrar o inquérito policial-militar, sistematizando as informações obtidas na fase das torturas.
No entanto, tratava-se de rapinantes que haviam sido privados do privilégio de capturar militantes revolucionários. Sem o que tomavam de nós e as recompensas dos empresários fascistas, estavam em dificuldades financeiras, pois haviam se desacostumado a viver apenas com o soldo.
Antigos torturados visitando a PE da Vila Militar em 2014

Alguém, provavelmente o tenente Ailton Joaquim, teve a brilhante ideia de arrancar informações novas dos presos da VPR (eu e alguns aliados que também foram deixados para trás), como forma de provar ao Exército que a PE da Vila Militar deveria ser readmitida no esquema de capturas e torturas.

Eu já estava lá há cinco dias, só de cueca, numa solitária imunda (e bem fria à noite), quando o ten. Ailton percebeu que não iria me dobrar com intimidações. Ordenou torturas. Levei choques e porradas. No caminho de volta à solitária, o descomunal cabo Polvorelli me deu um tapa na cabeça, estourando o tímpano de meu ouvido direito.

“…da sala vinham os gritos da ‘Enéia’ ao levar choques, 
ruídos de pancadas, a trilha sonora medonha da crueldade 
do ser humano contra o ser humano…”

O tenente deu-me papel e mandou que escrevesse sobre minha militância. No dia seguinte, uma quarta-feira, havia festividades no quartel. Ele apareceu em uniforme de gala, jogou as folhas na minha cara e disse que não havia nada de novo nelas. Eu respondi que não tinha mesmo nada para dizer que eles já não soubessem. Então, ele falou que eu entraria no pau de novo. Eu fiz uma pergunta desastrada: “O que eu posso fazer para convencê-lo de que não tenho mesmo nada para contar?”. De bate-pronto, o tenente respondeu: “Faça como o Massafumi”. E foi embora.
Nas tardes de quartas-feiras os recrutas eram dispensados, ficavam só os sentinelas. Aproveitando o meio-expediente, o tenente mandou torturarem uma companheira, de codinome Enéia. Sentado a uma mesa, bem ao lado da sala onde Enéia era torturada, recebi uma folha de papel almaço e caneta. O tenente disse para colocar no papel algo que o convencesse de que eu não voltaria a militar na guerrilha. “Se eu não ficar convencido, hoje você volta para o pau-de-arara!”.

Torturadores entravam e saíam da sala a todo momento; de passagem, davam-me socos e faziam ameaças: “Você é o próximo!”. E da sala vinham os gritos da Enéia ao levar choques, ruídos de pancadas, a trilha sonora medonha da crueldade do ser humano contra o ser humano.

O que acabei escrevendo foi uma mensagem aos jovens, de que não valia a pena entrarem na guerrilha naquele momento, pois a luta estava perdida e eles acabariam sofrendo em vão.
Jamais escreveria aquela carta por decisão própria, mas não menti. Sabia que as pessoas experientes já não tinham ilusões, mas os mais novos eram bem capazes de pegar em armas sem perceber que marchavam para o matadouro.
O tenente leu a carta e disse que, daquele momento em diante, eu ficaria tranqüilo. Deram-me uma cela, com cama, manta e chuveiro. Tirei a sujeira e o sangue pisado do corpo, sentindo o bem-estar de quem volta à civilização, depois de passar vários dias sendo tratado como um animal. Mergulhei em sono profundo.
Numa madrugada, acordaram-me e disseram que me vestisse, pois me levariam para ser executado. Na viatura, depois de fazerem muito jogo de nervos, explicaram: estava sendo conduzido a uma TV [a Globo, no Jardim Botânico] e deveria falar a mesma coisa que escrevera na carta, caso contrário entraria no pau até morrer e depois jogariam meu cadáver debaixo da ponte.
Já sem forças para resistir, acabei fazendo o que pediram: de forma sonambúlica, com a fala arrastada, respondi as perguntas, voltei para a cela e dormi. Quando acordei, não sabia nem se aquilo tinha ocorrido mesmo ou fora um pesadelo.
Comissão de Anistia: 35 anos depois, a vitória moral.

CC – Como foi o seu convívio com a sociedade quando você saiu da prisão?

CL: Virei tabu. Todos falavam de mim pelas costas. Quando entrei na ECA/USP, houve até reunião para decidirem como me receberiam. Cheguei a ser aprovado em testes para repórteres e, mesmo assim, não me chamaram depois. Acabei tendo de iniciar minha carreira em assessorias de imprensa (comunicação empresarial), levando quase 15 anos para chegar à grande imprensa.
O Massafumi, submetido à mesma pressão, enlouqueceu e se matou. O que me fez perseverar foi a convicção íntima de que sofrera uma grande injustiça e poderia esclarecer tudo algum dia.
Desde a meninice eu enfrentava situações em que todos ficavam contra mim; aprendera a sobreviver a isso e, com o tempo, reagir à altura. Isso fez a diferença. Nunca me vi pelos olhos dos outros, como o Massafumi. A discriminação só reforçava minha determinação de provar que todos estavam errados.
CC – Mesmo tendo sofrido toda essa injustiça, e tendo sido acusado por tantos anos por algo que não fez. Qual foi o melhor momento que você viveu em todos esses anos?
 Adiante, Lungaretti lutaria 4 anos pela liberdade de Battisti.

CL: O melhor momento foi esse mágico final de 2004. Primeiramente, o relator do meu processo na Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, Márcio Gontijo (ex-presidente da seção brasileira da Anistia Internacional), reconheceu que eu havia sido “duplamente atingido” pelo arbítrio ditatorial, já que sofrera torturas, uma lesão definitiva e um período de prisão, como muitos outros também haviam sofrido, acrescidos de danos morais gravíssimos por haver sido forçado a uma exposição negativa que me marcou durante décadas. Logo em seguida, descobri o relatório secreto militar que comprovou minha inocência no episódio de Registro.

Estava desempregado há 11 meses, passando privações e ciente de que a virada na minha vida não iria materializar-se imediatamente. Mas, naquele momento, tive a certeza de que a partida estava ganha. Dali em diante, seria só questão de tempo.
CC – Celso, hoje você ainda tem contato ou é amigo de algum militante da VPR ou de outra organização?
CL: Dos velhos companheiros, a Maria das Graças, que agora é socióloga respeitada com o nome de Maria Palácios; o Diego e o Gílson. Também troco e-mails com o Mané. E já me correspondi com o José Ibrahim, o Mário Japa e o Antônio Roberto Spinoza.

Também houve aproximações com pessoas que não conheci no passado, mas se tornaram simpáticas a mim. Mas, não seria elegante citá-las, sem a devida autorização.

CC – Hoje, com todos os fatos verdadeiros expostos, e a sua inocência realmente comprovada. O que você tem a dizer sobre tudo o que viveu nesse período?
CL: Soa como uma heresia materialista dizer algo assim, mas, às vezes, parece haver algum desígnio obscuro naquilo por que passei. Tive um imenso azar em 1970, quando tudo concorreu para que eu fosse injustamente colocado na berlinda. E a minha vida inteira me preparou para a luta travada em 2004/2005, quando recuperei o que haviam me tomado.
A sensação que tenho hoje é de alívio. Nos piores momentos, temi que a verdade só fosse restabelecida após minha morte. Hoje, tenho certeza de que meus descendentes não se envergonharão de mim. E ainda me resta tempo para dar minha contribuição ao processo revolucionário brasileiro. Tentarei não desperdiçá-lo.

A "FOLHA DE S. PAULO" NOVAMENTE ACHINCALHA A LUTA CONTRA A DITADURA

O jornal da ditabranda continua publicando péssimos editoriais sobre os acontecimentos dos anos de chumbo, talvez porque o papel então desempenhado pelo Grupo Folha foi nada menos que indecoroso, daí seu desconforto ao tocar nesses assuntos. 

Para quem quiser conhecer mais detalhes sobre tal papelão, recomendo a leitura deste meu artigo. Vale, contudo, destacar alguns trechos de um texto autocrítico publicado pela própria Folha de S. Paulo quando da comemoração do seu 90º aniversário: 

A partir de 1969, a ‘Folha da Tarde’ alinhou-se ao esquema de repressão à luta armada, publicando manchetes que exaltavam as operações militares.

A entrega da Redação da ‘Folha da Tarde’ a jornalistas entusiasmados com a linha dura militar (vários deles eram policiais) foi uma reação da empresa à atuação clandestina, na Redação, de militantes da ALN… 

Em 1971, a ALN incendiou três veículos do jornal e ameaçou assassinar seus proprietários. Os atentados seriam uma reação ao apoio da ‘Folha da Tarde’ à repressão contra a luta armada.

Segundo relato depois divulgado por militantes presos na época, caminhonetes de entrega do jornal teriam sido usados por agentes da repressão, para acompanhar sob disfarce a movimentação de guerrilheiros. A direção da ‘Folha’ sempre negou ter conhecimento do uso de seus carros para tais fins [o grifo é meu].

Sempre negou, mas ninguém, em sã consciência, acreditou!

PAGAMOS UM PREÇO ALTÍSSIMO POR
TERMOS SALVADO A HONRA NACIONAL
A visão que a Folha dá atualmente da faina da Comissão Nacional da Verdade e das reações militares é bem na linha de botar panos quentes e aparar arestas. Mas, se estas continuam existindo e machucando, é porque a Justiça não foi feita e tudo indica que jamais o será.

O mais inaceitável no editorial desta 2ª feira, 29 (acesse a íntegra aqui), são estes dois parágrafos:

O principal mérito da Lei da Anistia, promulgada em 1979, foi o de permitir que o processo de democratização do país se desse num clima desanuviado dos ressentimentos que pesavam sobre ambas as partes em conflito.

A esmagadora maioria dos que se envolveram na luta armada, a começar da própria presidente Dilma Rousseff (PT), não tem problemas em fazer a revisão histórica de sua estratégia, fundada não só num romantismo revolucionário juvenil, mas também na exaltação da violência e num desprezo ao que então se desqualificava com o termo ‘democracia burguesa’.

A redemocratização do País se deu, na verdade, em clima dos mais tensos, com a oposição tendo de engolir a anistia que igualou as vítimas a seus algozes porque era este o preço a pagar pela libertação dos presos políticos e a permissão de volta dos exilados. Mesmo assim, num primeiro momento foram excluídos os militantes condenados por ações armadas.
Foi, portanto, mediante a mais escrachada chantagem que os oposicionistas acabaram cedendo e concordando com o que sabiam ser uma abominação; afinal, tiranos não podem anistiar a si próprios em plena tirania. Fico a imaginar os criminosos de guerra nazistas munindo-se em 1944 de um habeas corpus preventivo semelhante. Se lhes houvesse ocorrido este brilhante expediente, teriam porventura evitado o julgamento de Nuremberg?    
Quero ser mico de circo se tal quadro caracteriza um “clima desanuviado dos ressentimentos que pesavam sobre ambas as partes”. 
Quanto aos que pegamos em armas contra a ditadura, não me lembro de nenhum de nós fazendo a “exaltação da violência”, muito menos em função de “romantismo revolucionário juvenil”. 
Sabíamos que se tratava de uma opção quase suicida. Tínhamos plena consciência de que, sendo capturados, as piores torturas eram uma certeza e a morte, uma forte possibilidade. Só assumimos riscos tão extremos porque era a única maneira de continuarmos confrontando os usurpadores do poder sob o terrorismo de estado desmedido que eles desencadearam a partir do AI-5.  
Ao editorialista responsável por tais despropósitos, eu sugiro a leitura deste artigo  no qual relembro quão sofrido era nosso dia a dia. Não encarávamos uma barra tão pesada por fetiche pelas armas nem por arroubos adolescentes. Nosso motivo era bem outro: o de não suportarmos ver 90 milhões de brasileiros tratados como crianças tuteladas,  intimidadas e castigadas. 
E, como não sobrava “democracia burguesa” nenhuma no Brasil dos anos de chumbo, também não havia motivo nenhum para a desprezarmos naquele momento. Cada um de nós tinha algo muito mais imediato com que se preocupar: a própria sobrevivência, para continuar lutando o máximo possível, pois cada dia poderia ser o último.
Finalmente, no tocante a fazermos a revisão histórica da nossa estratégia, eu quero deixar bem claro que não me incluo na citada “esmagadora maioria” (aliás, desconheço qualquer pesquisa que respalde tal dimensionamento, o qual parece ser, isto sim, um chute conveniente).

A luta armada, na verdade, se constituía na única estratégia viável depois que todos os caminhos de contestação pacífica ao regime foram fechados e as torturas se tornaram bestiais e generalizadas, com os tribunais impedidos até de nos concederem habeas corpus.

O resultado foi trágico e até hoje não consigo aceitar o assassinato das duas dezenas de valorosos companheiros que conheci pessoalmente, incluindo um amigo de infância. 
Mas, o Brasil seria um país de pobres coitados se nem sequer uns poucos milhares de brasileiros houvessem se recusado a viver debaixo das botas. Pagamos um preço altíssimo por termos salvado a honra nacional. Merecemos respeito.

OS MILITARES FINALMENTE ADMITEM AS ATROCIDADES DOS ANOS DE CHUMBO

A notícia é de Eliane Cantanhêde e está na edição deste sábado, 20, da Folha de S. Paulo (a íntegra pode ser acessada aqui):
O ministro da Defesa, Celso Amorim, encaminhou nesta sexta-feira (19) à Comissão Nacional da Verdade (CNV) ofícios das três Forças Armadas admitindo, pela primeira vez, que não têm condições de negar a ocorrência de graves violações aos direitos humanos em instalações militares durante a ditadura.
Conforme a Folha apurou, o Comando da Aeronáutica afirma não ter elementos para contestar que houve graves violações nem o reconhecimento da responsabilidade do Estado, e o da Marinha alega que não tem provas para negar nem confirmar as violações apontadas pela CNV.
O ofício do Comando do Exército não contradiz os dados de violações fornecidos pela comissão, alegando que não seria pertinente contestar decisões já tomadas pelo Estado brasileiro (que já reconheceu a existência de torturas e mortes no período) nem as circunstâncias configuradas em lei neste sentido.
Foi uma referência à lei que concedeu indenização às vítimas e às famílias de mortos e desaparecidos e à que criou a Comissão da Anistia.
Na avaliação da Defesa, é um passo importante a mais no processo de reconhecimento público, pelas três Forças, de que houve torturas e mortes durante aquele regime e que o Estado brasileiro tem responsabilidade pelo ocorrido. A área civil dos sucessivos governos já reconhece essa realidade há anos.
…Em documento a subordinados em fevereiro, o general Enzo Peri, comandante do Exército, proibira que unidades militares dessem informações sobre crimes ou violências em suas dependências. No texto, Peri ordenou que qualquer informação referente ao tema só deveria ser respondida pelo gabinete.
RESUMO DA OPERETA
Antes tarde do que nunca e apesar das reticências que utilizaram para não darem o braço totalmente a torcer (“não seria pertinente contestar”, etc.), os comandantes militares insubmissos foram colocados no seu devido lugar.  Sob vara, tiveram de atualizar seus calendários, reconhecendo que estamos em pleno século 21 e não na tenebrosa década de 1970. Alvíssaras!

Mas, não nos empolguemos em demasia. É bom lembrarmos que a resposta ultrajante dos fardados à Comissão Nacional da Verdade, negando os assassinatos e torturas dos anos de chumbo, data de 17 de junho; e que o ofício de 25/02/2014 do comandante do Exército, general Enzo Peri, proibindo os oficiais de colaborarem com as investigações da Comissão da Verdade e orientando-os a repassarem os pedidos e questionários para seu gabinete,  só se tornou conhecido quando O Globo noticiou, em 22 de agosto, caso contrário o estaríamos ignorando até hoje.

Nos dois casos, impunha-se uma resposta imediata, que restabelecesse o respeito à hierarquia. Afinal, como  o próprio Comando do Exército agora reconhece, o Estado brasileiro já dera seu posicionamento definitivo sobre tais crimes. Fico me indagando se não foi o fato de estarmos num ano eleitoral que evitou os habituais panos quentes…

Quem ousou cutucar tal ferida, como o Luiz Cláudio Cunha e eu, deveria agora ter sua coerência reconhecida: não é calando para evitar constrangimentos ao governo, mas sim botando a boca no trombone, que se consegue direcionar os acontecimentos no sentido correto.

Em tempo: desde a primeira insubordinação dos comandantes militares, em agosto de 2007 (vide aqui), tenho me posicionado contra a contemporização e várias vezes afirmei que os altos oficiais blefavam, pois atualmente não conseguiriam arrastar as tropas para aventuras golpistas. Agora ficou provado que eu estive certo durante todo esse tempo.

OS BRASILEIROS FINALMENTE PERDERAM O MEDO DE SER FELIZES. AÍ FOI O PT QUE NÃO OUSOU FAZÊ-LOS FELIZES…

Uma tarefa a que sempre me propus é a de garimpar as raras pepitas existentes em meio às toneladas de ouro de tolo com que os leitores se deparam no período eleitoreiro. Trata-se de uma tarefa das mais relevantes, pois a manipulação agora atinge os píncaros, com os veículos da grande imprensa e uma verdadeira legião de blogueiros amestrados competindo encarniçadamente pelo Troféu Goebbels de Martelagem de Mentiras
O que há para ser lido nesta 5ª feira (18) é a notícia Impasse com PT faz Dilma suspender plano de governo (acesse a íntegra aqui), de duas jornalistas da sucursal de Brasília da Folha de S. Paulo, Andréia Sadi e Natuza Nery.
Por quê? Porque fornece um quadro de bastidores que é bem coerente com o que os observadores perspicazes já depreendiam da bizarra demora de Dilma Rousseff em divulgar seu programa de governo.
Nunca superestimei esses papeluchos, que geralmente estão mais para peças propagandísticas do que qualquer outra coisa, produzindo espuma colorida cujo destino, depois das eleições, é o ralo.
Há até boas intenções, só que raras e inconciliáveis com os valores mais altos que (posteriormente) se alevantam, como diria Camões. Acabam pavimentando o caminho do nosso peculiar inferno tropical, no qual tudo conspira para o inarredável imobilismo ou o eterno retrocesso.
Mesmo assim, os programas são faca de dois gumes, pois os adversários os utilizam para, fazendo leituras distorcidas e tendenciosas, imputarem ao candidato cuja reputação querem assassinar os intentos mais sinistros e estapafúrdios, que nem a Spectre dos filmes do 007 seria capaz de cogitar a sério…
É o que a campanha petista tem feito com o programa de Marina Silva e com certas declarações de seus supostos futuros ministros.
E é por medo do troco que reluta tanto em expor o seu, preto no branco, ao fogo inimigo. Adora tanto ser estilingue quanto detesta ser vidraça.
Isto tudo era adivinhável e a notícia citada só veio confirmar.
O mais interessante é a identificação do que está pegando:

…coordenadores da campanha enviaram a assessores presidenciais a proposta sobre trabalho.

O documento propunha, entre outros pontos, avançar na negociação para a redução da jornada de trabalho, o fim do fator previdenciário (que reduz o valor de aposentadorias precoces) e a regulamentação da terceirização.

Apesar de não declarar publicamente, o governo evita há quatro anos que a proposta do fim do fator previdenciário seja votada no Congresso. O Planalto enfrenta pressão das centrais sindicais, mas nunca se comprometeu com a ideia da redução da jornada de trabalho. 

A Folha apurou que, ao tomar conhecimento por assessores das propostas para trabalho e emprego, Dilma determinou o adiamento da divulgação do programa.

Outro ponto de atrito é a revisão da Lei de Anistia. Dilma já disse, reservadamente, ser pessoalmente a favor, mas não encaminha a medida para não provocar crise com as Forças Armadas.

As repórteres lembram que, em 2010, o plano de governo de Dilma  inicialmente incluía “bandeiras importantes para a esquerda, como a democratização dos meios de comunicação”, que acabaram sendo substituídas adiante por propostas menos polêmicas.
Resumo da opereta: 
  • é alentador constatarmos que ainda há correntes no PT querendo fazer a coisa certa, pois o mínimo que se espera de um partido dos trabalhadores é a luta pela redução da jornada de trabalho, pelo fim do fator previdenciário e pela extinção da falsa terceirização (amplamente majoritária), um mero artifício para privar os trabalhadores dos direitos que haviam adquirido, deixando-os à inteira mercê da cupidez capitalista;
  • mas, é desalentador ficarmos sabendo que a pressão das centrais sindicais até agora tem sido infrutífera, pois os dirigentes do PT preferem não atritar-se com o grande capital; e
  • mais desalentador ainda termos a confirmação de que a presidenta foge ao confronto com as Forças Armadas (ou, mais precisamente, com altos oficiais que estão apenas blefando, pois jamais conseguiriam arrastar as tropas para aventuras institucionais nas circunstâncias presentes).
NEGACEIOS EM CASCATA
O último item não surpreenderá os leitores dos meus artigos, pois escancarei, a cada episódio, a relutância de Dilma em fazer valer sua condição de comandante suprema das Forças Armadas. Eis um resumo do que fez e deixou de fazer no tocante à impunidade dos torturadores:
  • ignorou a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos que responsabilizou o Brasil pelo desaparecimento de cerca de 70 pessoas no Araguaia e determinou uma série de providências, inclusive que fossem investigados, processados e punidos os agentes estatais responsáveis por tais desaparecimentos;
  • criou a Comissão Nacional da Verdade, acreditando que propiciaria o jus sperniandi para as vítimas inconsoláveis e serviria como um bom engana-trouxas para desviar a atenção da opinião pública da decisão memorável da OEA, que ela jamais pretendeu cumprir;
  • vergou-se à chantagem da bancada evangélica no Congresso, que só admitiu apoiar a instituição da CNV se dela ficassem excluídos não só os militares (ponto pacífico), mas também os veteranos da resistência armada à ditadura, o que equivaleu a considerar os resistentes tão inconfiáveis quanto os fardados, ou seja, a igualar novamente vítimas e algozes;
  • prorrogou, por meio de medida provisória, o prazo final para entrega do relatório final da CNV, que vencia em maio de 2014. Com um pouco de boa vontade, daria até para divulgá-lo no momento em que o golpe obtinha grande espaço na imprensa em função do 50º aniversário. Ao invés disto, Dilma preferiu postergar a divulgação para dezembro, quando a eleição já tiver sido decidida (ou seja, as conveniências eleitoreiras vêm sempre em primeiro lugar, como apontei aqui);
  • omitiu-se quando as Forças Armadas, ao invés de responderem a um questionário com indagações pontuais formuladas pela CNV, pariram um patético relatório genérico de 455 páginas (vide aqui), garantindo que as torturas e assassinatos jamais ocorreram; e
  • omitiu-se novamente quando o comandante do Exército determinou a todos os oficiais que não atendessem a CNV (vide aqui), direcionando quaisquer pedidos ou perguntas ao seu gabinete, o que, na prática, equivaleu a CENSURAR A CNV, sem dispor de poder legal para tanto e cometendo um abuso de autoridade que deveria ter sido respondido com sua exoneração imediata por parte da comandante suprema das Forças Armadas.
No último mês de janeiro, quando a imprensa noticiava que alguns integrantes da CNV estariam dispostos a incluir a proposta de anulação da auto-anistia dos torturadores no relatório final, eu, gato escaldado, apostei que tal decisão ficaria em banho-maria até o desfecho das eleições:

Temo que a revisão da Lei da Anistia venha a ser recomendada pela CNV apenas na hipótese de derrota da Dilma; seria um dos vários abacaxis a serem colocados no colo do(a) sucessor(a).

E que, vitoriosa, ela não queira nem ouvir falar do assunto, com a CNV abstendo-se de causar-lhe aborrecimentos.

Tomara que meus temores sejam infundados…

Infelizmente, tudo que ocorreu desde então só os veio reforçar.

O GOL DE PLACA QUE PELÉ FICOU DEVENDO: NÃO INTERCEDEU POR 8 PRESOS POLÍTICOS.

Pelé critica o goleiro Aranha por não haver ignorado as agressões racistas
Talvez o Romário não estivesse tão certo assim, ao dizer que “o Pelé, calado, é um poeta”.
Eu consideraria mais apropriada para o rei do futebol a frase do personagem Cheyenne (Jason Roberds) sobre o Harmonica (Charles Bronson), no clássico Era uma vez no Oeste, de Sergio Leone: “Ele fala quando deveria calar, e cala quando deveria falar”.
Pelé deveria calar quando, uma vez na vida, os ridículos tribunais esportivos justificaram a sua existência, ao excluírem de uma competição um time de futebol  em razão do racismo explícito de sua torcida. Ao invés de aplaudir a decisão inédita, preferiu admoestar a vítima, o goleiro santista Aranha, por não ter ignorado as ofensas:

Se eu fosse parar o jogo a cada vez que me chamassem de macaco ou crioulo, todo jogo teria que parar.

Mal não haveria, na verdade, em parar o jogo sempre que torcedores vilipendiassem covarde e repulsivamente um ser humano, dando um péssimo exemplo à sociedade, “criancinhas do Brasil” inclusas. O mais provável é que, depois de um certo tempo, tais turbas desistissem de prejudicar os clubes que alegam amar, causando-lhes prejuízos financeiros, perda de pontos e perda de mando de jogos. 
Mas, claro, para tomar uma atitude dessas nos anos 50, 60 ou 70, Pelé precisaria ter a estatura moral de um Muhammad Ali. Nunca teve.
Hoje tudo é mais fácil, pois o racismo passou a ser considerado crime e nem mesmo a justiça esportiva (as minúsculas são intencionais…) pode discrepar das leis maiores do País. 
Mas, duvido que Aranha tenha raciocinado tão longe, ao se revoltar com os xingamentos infames. O mais provável é que nem tenha se indagado sobre quais as consequências que lhe adviriam de tal atitude. 
Simplesmente, reagiu como um cidadão ultrajado deve reagir, com dignidade e coragem. Aceitar ser chamado de macaco ou crioulo nunca foi solução, trata-se apenas de uma forma de fugir do problema. 
FOI MESMO POR CAUSA DA DITADURA QUE 
ELE NÃO DISPUTOU O MUNDIAL DE 1974?
Outra ocasião em que Pelé deveria ter optado por permanecer poeticamente calado: quando inventou que não disputara a Copa do Mundo de 1974 por discordar da ditadura militar.
Para quem o conhece bem, a desculpa simplesmente não colou. Deu para todos percebermos que ele, com a visão majestática que tinha de si mesmo, preferiu não correr o risco de sua última participação em Mundiais da Fifa ser um fracasso; melhor sair por cima, com os louros de 1970.
Sua primeira alegação foi a de que já se despedira oficialmente da Seleção Brasileira, com direito a partida comemorativa e muitas homenagens, de forma que voltar atrás equivaleria a ter enganado o público. 
Mesmo com a cabeça quente por causa da derrota na semifinal contra a Holanda (será que, com Pelé presente, o Brasil não teria conseguido construir um placar favorável no 1º tempo, quando a partida foi equilibrada?), os torcedores e cronistas esportivos aceitaram a justificativa.
O caldo, contudo, entornou em 1975: com problemas financeiros, Pelé aceitou uma oferta intere$$ante do New York Cosmos e voltou ao futebol, não dando a mínima para os torcedores que haviam pagado ingresso nas suas partidas de despedida.
Alguns passaram a encará-lo como mercenário. Então, a posteriori, ele saiu pela tangente, dando como motivo secreto de sua decisão a indignação com a ditadura. Eis como ele conta a história atualmente:

Pediram para eu voltar para seleção, eu não voltei. Eu já tinha me despedido do Santos, mas eu estava bem demais. Mas o [ditador de plantão] Geisel, a filha dele, veio falar comigo, para eu voltar e jogar a Copa de 74. Por um único motivo não aceitei: estava infeliz com a situação da ditadura no país. Estava preocupado com o momento. Em apoio ao país, eu recusei, pois estava muito bem (físico e técnico) e poderia jogar em alto nível.

Mas, por que a ditadura não lhe causara horror no auge do terrorismo de estado (1970) e o incomodava tanto quando as matanças e a tortura brava já tinham diminuído (1974)? Como esta contradição foi percebida por muitos críticos de suas declarações, ele agora tem uma explicação  na ponta da língua, só que ela não explica nada:

A ditadura estava exigindo demais do povo. Em 1970 era diferente, a seleção era comandada pelo Zagallo, mas o [Carlos Alberto] Parreira e o [Cláudio] Coutinho eram do exército, e a situação era melhor.

Se alguém entendeu, me explique como a situação poderia ser melhor graças à presença de dois capitães do Exército como preparador físico e supervisor, afora o major-brigadeiro que comandou a delegação e o major do Exército que foi seu principal assistente…
GRANDE ESPORTISTA ELE FOI. 
GRANDE HOMEM, JAMAIS SERÁ!
O pior eu deixei para o fim. Trata-se da coluna O dia em que Pelé não ajudou presos políticos e se disse contra o comunismo (leia a íntegra aqui ), do competente Ricardo Perrone. Eis o principal:

…oito presos políticos trancafiados em Santos assinaram um dramático apelo por sua liberdade escrito em 60 linhas. Foi caprichosamente feito para ser entregue a Edson Arantes do Nascimento. O grupo solicitava que o Rei do Futebol usasse seu prestígio para pedir que Médici concedesse a eles indulto presidencial a fim de que não precisassem cumprir o restante da pena. Eles tinham sido condenados em 1969.

Pelé não atendeu ao pedido, e a carta ainda foi parar nas mãos da polícia da ditadura. Está preservada no Arquivo Público do Estado de São Paulo, que guarda os documentos do Dops e do Deops…

O episódio rendeu uma conversa tête-à-tête entre policiais que serviam à ditadura e Pelé… [o qual], ao dissociar sua imagem dos presos, afirmou ser contra o comunismo e alheio à convulsão política vivida pelo país naquela época.

‘Esclareceu ainda o esportista que, durante jogos que realizou no México, Colômbia e Bogotá foi assediado por comunistas para assinar manifestos contra o nosso governo, com o que não concordou por ser contrário ao comunismo’, diz trecho do informe, datado de 21 de outubro de 1970…

Da vez em que o Pelé deveria falar, apelando ao ditador Médici pela libertação daqueles oito pobres coitados (sindicalistas de Cubatão que nem de longe poderiam ser considerados perigosos subversivos…), ele calou, vergonhosamente. E a paúra transparece nas respostas dadas aos agentes da repressão, aparentemente ignorando que seu prestígio mundial o colocava a salvo de quaisquer maus tratos, intimidações e retaliações.
Certa vez, indagado sobre a omissão do Pelé em questões ligadas ao racismo, a lenda viva Muhammad Ali deu uma resposta sutil: alguém ser um grande esportista já é mais do que suficiente; se, além disto, trava as lutas do seu povo, é também um grande homem.
Pele foi somente um um grande esportista.

LOBÃO NA BERLINDA: TOMARA QUE CAIA!!!

Lobão deve ter ficado assim ao saber da denúncia
Não sou religioso, mas vou acabar acreditando que Deus escreve mesmo por linhas tortas.

Pois, segundo o Congresso em Foco (vide aqui), um dos beneficiários do propinoduto da Petrobrás dedurado por Paulo Roberto Costa é o Edison Lobão, que foi ministro de Minas e Energia entre 2008 e 2010, durante o governo Lula, e voltou a ocupar a Pasta em 2011, nela permanecendo até hoje.

Eis o que eu escrevi sobre mais este Lobão nocivo em outubro de 2008, sem que os grãos petistas dessem a mínima:

Participando de um evento em SP, Lobão fez elogios entusiásticos ao ditador Ernesto Geisel e ao regime militar, que, para ele, “foi um momento em que o Brasil reencontrou seu futuro, sua vocação para o desenvolvimento.”
Segundo Lobão, aquela fase de torturas e genocídios não deve nem mesmo ser qualificada como ditadura, pois “ditadura mesmo foi com o Getúlio [Vargas]”.
Este é o exemplo que Lobão segue e apregoa
Para o ministro de Lula, o período de arbítrio mais recente não passava de “um regime de exceção, autoritário, com Constituição democrática, que fazia eleições regularmente”.
Deu para entender? “Regime de exceção, autoritário”, todos sabem, equivale a ditadura. Lógica também não é o forte desse ministro que começou na Arena (partido de sustentação do regime militar), passou pelo PFL/DEM e agora é um dos representantes do PMDB no Governo Lula.
As eleições feitas “regularmente” (ou seja, nem sempre, pois podiam ser suspensas por ordem da caserna) não impediam que os eleitos fossem destituídos, quando não se vergavam suficientemente aos tiranetes de plantão. Até governadores acabaram defenestrados e o Congresso Nacional várias vezes esteve fechado para expurgos.
Afora, claro, o fato de que durante 21 anos o Brasil teve seus presidentes da República eleitos “regularmente” pela alta oficialidade militar e mais ninguém.
Finalmente, a tal “Constituição democrática” tinha o nome alternativo de Ato Institucional nº 5 e completará 40 anos no próximo dia 13 de dezembro.
Ou seja, por absoluta falta de vergonha na cara dos petistas, um reaça empedernido como este, fã de carteirinha do ditador Geisel, permanece até hoje sendo ministro de um governo dito de esquerda.

Torço para que o desfecho do episódio atual venha a ser o mesmo daquela velha marchinha carnavalesca:

Já estou cansado de pedir,
tomara que caia -me parece, vai cair-
CAIU!!!

PUNIÇÃO DOS TORTURADORES É PÉSSIMO ASSUNTO DE CAMPANHA PARA DILMA

A rede propagandística do PT deu o máximo de quilometragem possível a esta notinha do responsável interino pelo Painel Político da Folha de S. Paulo, publicada na 5ª feira, 4:

Antes era assim. Mais uma para a lista dos vaivéns de Marina. A candidata, que agora se diz contra a revisão da Lei da Anistia, pensava o contrário antes de disputar a Presidência. Ela defendia a punição de militares acusados de torturar na ditadura.

Agora é assado. Em 2008, Marina escreveu em artigo na Folha: ‘A tortura é crime hediondo, não é ato político nem contingência histórica. Não lhe cabe o manto da Lei da Anistia’. Ontem, em sabatina no portal G1, declarou que é contra rever a lei.

Até alguns que exercem ou já exerceram o ofício de jornalistas embarcaram nessa canoa oportunista, ajudando a trombetear só o que servia para desqualificar a candidatura por eles temida, sem mostrarem o mais ínfimo empenho em informar corretamente a seus leitores.
O único que honrou seu compromisso com a verdade foi Mário Magalhães (vide aqui), ao criticar o novo posicionamento de Marina, mas lembrar o singelo detalhe de que também Dilma Rousseff e Aécio Neves já haviam, antes dela, rechaçado a revisão da anistia de 1979:
Assim, na véspera da efeméride sinistra dos 50 anos da quartelada, Dilma afirmara que “nós reconquistamos a democracia à nossa maneira, por meio de lutas e de sacrifícios humanos irreparáveis, mas também por meio de pactos e acordos nacionais, muitos deles traduzidos na Constituição de 1988”, declarando em seguida, enfaticamente, que reconhecia e valorizava “os pactos políticos que nos levaram à redemocratização”. O principal destes pactos, obviamente, foi a anistia que equiparou as vítimas a seus algozes.
Quanto a Aécio Neves, instado pelo G1 a responder com um “sim” ou um “não” a diversas questões, cravou um “não” na referente à “revisão da lei da anistia”.
Bem, os três cometem um erro grosseiro, já apontado várias vezes por grandes juristas nacionais e internacionais, além de repudiado pela ONU e insustentável à luz do Direito dos povos civilizados: admitem a possibilidade de agentes de uma ditadura munirem-se, em pleno regime de exceção, de uma espécie de habeas corpus preventivo para evitar que seus crimes sejam apurados e punidos adiante, quando se der a redemocratização do país.
Cansei de escrever que a esperança de ainda vermos encarcerados os torturadores e seus mandantes é quimérica, pois seriam necessários morosos trâmites na esfera do Executivo e do Legislativo, seguidos de processos que se arrastariam por todas as instâncias de nosso letárgico Judiciário, com ampla margem de manobras para os advogados de defesa retardarem ad nauseam seu desfecho. Só chegaríamos no fim da linha (o trânsito em julgado) lá pela próxima década, mas –surpresa!– se ainda restassem torturadores vivos para pagarem por suas atrocidades, se contariam nos dedos de uma mão…
Ainda assim, a autoanistia dos torturadores nos coloca em ridículo mundial e é um péssimo precedente legal, que poderá beneficiar os carrascos de uma ditadura vindoura (torcemos para que nunca mais haja alguma, mas não se sabe…). Então, com ou sem efeitos práticos imediatos, a Lei de Anistia precisa, sim, ser REVOGADA E SUBSTITUÍDA POR UMA QUE NÃO FAVOREÇA ABERRANTEMENTE OS ALGOZES E SICÁRIOS DO ESTADO.
De resto, é chocante que a rede propagandística petista invista sorrateiramente contra Marina num terreno tão desfavorável a Dilma Rousseff, pois a presidenta:
  • ignorou a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos que responsabilizou o Brasil pelo desaparecimento de cerca de 70 pessoas no Araguaia e determinou uma série de providências, inclusive que fossem investigados, processados e punidos os agentes estatais responsáveis por tais desaparecimentos;
  • criou a Comissão Nacional da Verdade, acreditando que propiciaria o jus sperniandi para as vítimas inconsoláveis e serviria como um bom engana-trouxas para desviar a atenção da opinião pública da decisão memorável da OEA, que ela jamais pretendeu cumprir;
  • vergou-se à chantagem da bancada evangélica no Congresso, que só admitiu apoiar a instituição da CNV se dela ficassem excluídos não só os militares (ponto pacífico), mas também os veteranos da resistência armada à ditadura, o que equivaleu a considerar os resistentes tão inconfiáveis quanto os fardados, ou seja, a igualar novamente vítimas e algozes;
  • prorrogou, por meio de medida provisória, o prazo final para entrega do relatório final da CNV, que vencia em maio de 2014. Com um pouco de boa vontade, daria até para divulgá-lo no momento em que o golpe obtinha grande espaço na imprensa em função do 50º aniversário. Ao invés disto, Dilma preferiu postergar a divulgação para dezembro, quando a eleição já tiver sido decidida (ou seja, as conveniências eleitoreiras vêm sempre em primeiro lugar, como apontei aqui);
  • omitiu-se quando as Forças Armadas, ao invés de responderem a um questionário com indagações pontuais formuladas pela CNV, pariram um patético relatório genérico de 455 páginas (vide aqui), garantindo que as torturas e assassinatos jamais ocorreram; e   
  • omitiu-se novamente quando o comandante do Exército determinou a todos os oficiais que não atendessem a CNV (vide aqui), direcionando quaisquer pedidos ou perguntas ao seu gabinete, o que, na prática, equivaleu a CENSURAR A CNV, sem dispor de poder legal para tanto e cometendo um abuso de autoridade que deveria ter sido respondido com sua exoneração imediata por parte da comandante suprema das Forças Armadas.
Resumo da opereta: se o posicionamento em relação aos torturadores for determinante na decisão de voto, azar de Dilma, que perde de goleada para Marina e Aécio. Os três se posicionaram da mesmíssima maneira, mas só Dilma detém o poder para ir além das palavras e, até por ser a única do trio que passou pelos porões da ditadura, poderia ter agido com um mínimo de coerência, sem, p. ex., recuar vergonhosamente diante dos sucessivos blefes dos fardados.

A VERSÃO DO CONDENADO NO TRIBUNAL DA VPR NÓS JÁ TEMOS. FALTA QUEM APRESENTE O "OUTRO LADO"…

Já pensaram nisto aqui com o triplo de público?! Pois é… 
A Bienal Internacional do Livro de São Paulo tinha gente saindo pelo ladrão neste sábado (30), véspera do encerramento. 
O espaço é insuficiente para um evento de tal porte; as ruas eram estreitas e a circulação, dificultada ainda mais pela existência de vários pontos de engarrafamento; os estandes não tinham número, embora os procurássemos pelo dito cujo que as editoras haviam anunciado e a imprensa publicado; o transporte gratuito a partir da estação do metrô não dava conta da demanda e a fila  foi se tornando quilométrica; minha esposa passou quase uma hora tentando adquirir ingresso, sua vez nunca chegava e ela acabou desistindo…. Enfim, foi o horror, o horror!
Como eu assumira o compromisso de estar presente para receber os visitantes juntamente com a Adriana Tanese Nogueira, aproveitei minhas prerrogativas de idoso para entrar com menos sufoco. Até chegar ao estande, contudo, sofri pisões, encontrões e atentados à minha paciência, que resistiu bravamente. Mas, quero ser mico de circo se colocarei o pé em qualquer edição futura, enquanto não a transferirem para local mais apropriado. O corvo disse: nunca mais!

A FAMÍLIA EM PRIMEIRO LUGAR
A luta foi heroica, mas isto não nos exime das autocríticas.
Dos veteranos da VPR, só estávamos lá eu e o Mário de Freitas. O Antônio Nogueira da Silva Filho deve ter-se perdido no pandemônio, pois ia para lá, mas lá não chegou  na hora prevista. Enfim, entre nossas lembranças e o que a Adriana apurou para escrever o livro Acorda, amor (vide aqui), deu para trocarmos muitas reminiscências. Nós, velhos guerreiros, adoramos uma boa hora da saudade
Para fechar esta série, esclareço que o Nogueira, como aliado da VPR, participou em 1969 dos encaminhamentos para implantação de uma área de treinamento guerrilheiro em Goiás, onde, depois se decidiu, ele próprio deveria ser treinado para integrar a futura guerrilha.
Refletindo melhor, resolveu que a responsabilidade para com a esposa e três filhos vinha em primeiro lugar. Então, comunicou à VPR que não participaria da guerrilha, mas estava disposto a permanecer na área durante todo o período de treinamento, a fim de não se tornar um risco para a segurança do projeto. Quando a área perdesse a utilidade e fosse abandonada, ele se desligaria da Organização.
Por que sua sensata proposta não foi aceita? Provavelmente, porque a VPR já teria desistido da área em Goiás, preferindo a de Registro (SP), onde a rede de apoio estaria bem mais próxima. 
Então, a O. reagiu muito mal: simplesmente o submeteu a um tribunal revolucionário in absentia e dois dos juízes decidiram expulsá-lo, enquanto o terceiro, voto vencido, preferia o justiçamento
Tribunal revolucionário, quem merecia era o cabo Anselmo!
Todos os militantes receberam a ata do julgamento, da qual o Nogueira só tomou conhecimento por camaradagem do saudoso José Raimundo da Costa, o Moisés (segundo o condenado, o relato distorceu muito o que ocorrera, para o desqualificar e vilificar, erigindo-o em mau exemplo que ninguém deveria seguir).
ABANDONADO À PRÓPRIA SORTE
Pior: todos os que tinham contato orgânico com ele, foram orientados a não cobrirem os pontos. Os recados que o Nogueira deixou numa caixa de correio da VPR ficaram sem resposta. Nem mesmo da expulsão teria sido comunicado, caso não houvesse se encontrado casualmente com o Moisés. E nenhuma ajuda lhe foi dada para sair do Brasil, mesmo já sendo perseguido pela repressão.
[O mesmo tratamento recebeu Massafumi Yoshinaga quando se desligou da VPR. Embora sua passagem pela O. o tivesse tornado procuradíssimo pelo DOI-Codi, não recebeu nem auxílio financeiro, nem nenhuma ajuda para deixar o País, acabando por se tornar praticamente um mendigo a dormir nas barracas do Mercado Municipal. Isto em muito contribuiu para sua decisão de entregar-se e servir como trunfo propagandístico para a ditadura.]
Também com o Bacuri (Eduardo Leite) o Nogueira cruzou, recebendo outras informações chocantes sobre o julgamento. Explica-se: por mais que isto fosse desaconselhável e perigoso, acostumávamo-nos a marcar os pontos em certos locais da cidade, então um descontatado às vezes reencontrava por aí o fio da meada.
Com muita dificuldade, o Nogueira acabou conseguindo deixar o país e juntar-se à família na Itália. Também sem conhecimento da O., o Moisés lhe cedeu um passaporte em branco, para facilitar sua fuga. 
REVOLUCIONÁRIOS OU AVESTRUZES?
O Projeto Orvil (o chamado livro negro da repressão, montado com as informações dos inquéritos policiais-militares e com aqueles  arquivos secretos dos torturadores que só o governo não consegue achar… ) aponta como juízes do tribunal revolucionário o Carlos Alberto Soares de Freitas, o Ladislau Dowbor… e eu! 
O primeiro foi assassinado pelos gorilas em 1971; o Ladislau hoje é um doutor em Ciências Econômicas que se distanciou por completo do seu passado de militante e dirigente revolucionário; e, na última vez que tive notícias daquele que Nogueira considera o principal responsável por sua desgraça, o Mário Japa (Chizuo Osava), ele estava casado com a Maria do Carmo Brito, morava no RJ e era correspondente de uma agência noticiosa estrangeira.
O lançamento de Acorda, amor dá, aos que podem apresentar o outro lado deste episódio, uma boa oportunidade para o fazerem. Afinal, 45 anos depois, só o que nos resta é contribuirmos para que a História registre a versão correta dos acontecimentos, doa a quem doer (inclusive a nós mesmos, se for o caso). A verdade é revolucionária!!! 
Eu, p. ex., detesto ser envolvido num episódio do qual não participei e nem sequer tomei conhecimento na época. Dos três juízes –ninguém garante que os outros dois nomes não sejam igualmente incorretos– os que porventura estejam vivos poderiam muito bem dar-se a conhecer, assumindo o papel que representaram e o justificando ou por ele se desculpando. O Chizuo, idem.